A Ordem dos Médicos de Portugal abriu um processo disciplinar contra o médico Fernando Nobre na sequência das declarações do fundador e presidente da Assistência Médica Internacional (AMI) durante a manifestação negacionista em frente à Assembleia da República de 11 de Setembro – horas depois de um grupo participante no protesto ter insultado e ameaçado o Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, durante um almoço com a mulher.
Por Orlando Castro
Na intervenção que fez na manifestação, Fernando Nobre considerou “inacreditável” vacinar crianças e jovens dos 12 aos 16 anos e referiu que se tratou a si próprio da infecção, assim como à mulher e à filha, com medicamentos que não estão aconselhados para a Covid-19.
“Numa semana estávamos todos bem”, assegurou Fernando Nobre, que salientou ainda que trabalhou em várias epidemias e nunca recebeu “nem mais um cêntimo” por isso, alegando que era esta a sua função de médico.
Vejamos agora – na íntegra – o capítulo “O caso Fernando Nobre”, do meu livro “Cabinda – Ontem Protectorado, Hoje Colónia, Amanhã Nação”, publicado em 2011:
«O candidato à presidência da República portuguesa, Fernando Nobre, defendeu no dia 10 de Julho de 2010 que o Governo de Luanda conceda a Cabinda parte dos recursos financeiros retirados daquela colónia (província segundo ele) que deve encontrar autonomia administrativa e financeira no quadro da unidade de Angola.
Embora pudesse recordar que cerca de 70% do petróleo exportado por Angola é extraído em Cabinda, Fernando Nobre – que recentemente se rendeu à tese de que Angola vai de Cabinda ao Cunene – ficou-se pela referência à autonomia financeira.
“Acredito que Cabinda tem que encontrar a sua autonomia administrativa e financeira no quadro da unidade de Angola e que o Governo Angolano tem que conceder exactamente uma parte significativa dos recursos financeiros que são retirados de Cabinda para fazer desta uma província angolana com o desenvolvimento económico, social e cultural que sirva as populações”, disse à Lusa o candidato presidencial Fernando Nobre.
Candidato que, ainda não há muito tempo, dizia: “Que o povo português nunca esqueça, apoiando-os, os povos irmãos angolano e cabinda com o qual partilha tantos laços de sangue e de História. Eles merecem”?
Co-fundador da Associação do Tratado de Simulambuco, Fernando Nobre defende, agora que mudou de opinião, que “Cabinda poderia ter sido um país independente” se “no momento da independência de Angola os fundamentos do tratado de Simulambuco tivessem sido bem entendidos”.
Mas, “como assim não aconteceu”, acrescenta, “o quadro de uma unidade nacional angolana é hoje inquestionável em termos internacionais” pelo que apela “a que as pessoas [governo angolano e a Frente de Libertação do Estado de Cabinda (FLEC)] se possam sentar à mesa das negociações e chegar por consenso a um acordo”.
E como, nessa altura (1975), Portugal resolveu varrer para debaixo do tapete todos os acordos que não interessavam ao MPLA, a rendição é – segundo Fernando Nobre – a única solução.
O apelo surgiu um dia depois de o “presidente” interino da FLEC, Alexandre Builo Tati, que encabeça o auto-denominado “movimento renovador” dessa organização, ter defendido o “diálogo entre angolanos e cabindas”, como via para resolver o conflito de Cabinda.
Fernando Nobre sublinha que “a população angolana está hoje sedenta de paz, estabilidade e desenvolvimento” e acredita na disponibilidade do governo para desenvolver negociações que ponham fim ao conflito e que permitam à população de Cabinda “olhar para o seu futuro, com confiança, sem medo e que possa alcançar o progresso que merecem, tendo em conta as riquezas fabulosas daquele território, nomeadamente o petróleo e as madeiras”.
A ser verdade que Fernando Nobre “sempre defendeu uma autonomia de Cabinda no quadro institucional angolano, como não poderia deixar de ser, tendo em conta a situação vigente”, estanha-se – no mínimo – que as autoridades angolanas tenham, em Novembro de 2007, manifestado um vivo e agressivo protesto contra diversas personalidades portuguesas como Maria Antónia Palla, Fernando Nobre, João Soares, Maria Barroso e Maria João Sande Lemos.
Tudo porque, a conferência “Caminhos para a paz” teve o apoio da “Associação Tratado de Simulambuco” e contou também com a presença do então líder parlamentar da UNITA, Alcides Sakala, bem como com os deputados Filomeno Vieira Lopes e Luís Araújo, ambos do partido Frente Para a Democracia, FPD, e do economista Justino Pinto de Andrade.
A ser verdade que Fernando Nobre “sempre defendeu uma autonomia de Cabinda no quadro institucional angolano, como não poderia deixar de ser, tendo em conta a situação vigente”, estranha-se (estanho eu) que o regime angolano tenha dito que os organizadores “pretenderam apagar ou ignorar muitos factos que demonstram a atitude dialogante e reconciliadora desde há muito assumida pelo Governo angolano, incluindo no tratamento da questão de Cabinda».
Fora desse capítulo, acrescente-se que em 2002 Fernando Nobre apoiou a candidatura de Durão Barroso às eleições legislativas de 2002, por confiança pessoal no candidato e crença na necessidade de mudança de ciclo em relação ao período de António Guterrista, falando mesmo na Convenção do PSD desse ano. Disse depois arrepender-se desse apoio por ter sido decepcionado pela sua prestação como primeiro-ministro e saída do cargo para presidir à Comissão Europeia.
Em 2006 foi membro da Comissão Política da candidatura de Mário Soares às eleições presidenciais portuguesas de 2006.
Em 2009 foi mandatário nacional do Bloco de Esquerda, nas eleições europeias e membro da Comissão de Honra da candidatura de António Capucho, pelo PSD, à Câmara Municipal Cascais.
Em 2010 apresentou-se como candidato às Eleições presidenciais portuguesas de 2011. Sem apoios partidários, alcançaria um resultado de cerca de 14%.
Em 2011, a convite do líder do PSD, Pedro Passos Coelho, aceita ser cabeça-de-lista por Lisboa nas eleições legislativas portuguesas. A página de Facebook de Fernando Nobre foi inundada de comentários a criticar esta decisão, alegando inconsistências com uma declaração anterior, na qual afirmava: “excluí a minha participação política, nem como independente, no âmbito dos partidos existentes, nem em actuais ou futuros governos partidários”.
Em 13 de Abril de 2011, Fernando Nobre declarou que se não tivesse a maioria absoluta dos votos dos deputados para ser eleito presidente da Assembleia da República então iria renunciar ao mandato de deputado e ao lugar na bancada do PSD.
O ex-director da campanha para as eleições presidenciais, Artur Pereira, afirmou que Fernando Nobre tinha sido convidado também pelo PS para integrar a lista de candidatos do partido às eleições legislativas. Essa proposta entretanto foi recusada a favor de uma proposta concorrente do PSD, por lhe terem garantido a proposta para presidente da Assembleia da República caso o partido vencesse as eleições.
Em 20 de Junho de 2011, ao ver a sua candidatura ao cargo de Presidente da Assembleia da República ser rejeitada à segunda volta da eleição, Fernando Nobre anunciou a retirada da mesma e disse ser de sua vontade manter o cargo de deputado. No entanto, nunca mais participou no Plenário da Assembleia da República. No dia seguinte à sua retirada da candidatura, Maria da Assunção Esteves foi eleita para Presidente da Assembleia da República com 186 votos a favor, 41 votos em branco e 1 voto nulo.
Em 1 de Julho de 2011, em carta enviada à Assembleia da República, renunciou ao cargo de deputado.
Em 6 de Janeiro de 2012, em entrevista à SIC, Fernando Nobre assumiu pertencer à grande Loja do Oriente Lusitano, defendendo que os membros das lojas maçónicas se devem assumir como tal.